terça-feira, 12 de agosto de 2014

Campos floridos

[No LinkedIn apareceu um post que dizia  Além da tenda: Por que campos de refugiados precisam de arquitetos (agora mais do que nunca) Comecei a escrever um comentário e, quando dei por mim, este texto estava quase pronto.]

Sempre achei que os campos de refugiados seguissem a mesma "disposição" que os campos, tipo bivouacs, militares; são temporários.

Refugiados islámicos na 1ª Guerra dos Balcãs

O que vemos hoje em dia é uma (des)temporalização dos campos e o aumento de seu "consumo" (como em densidade populacional) com as agravantes inerentes a esse adensamento.

Assume-se "refugio" como situação passageira, não como o tônus regional e caos em que se convertem. Esses deslocamentos populacionais 'en masse' só acontecem em tempos de crise (natural ou política) e vão somente até a periferia do distúrbio. Dificilmente se afastam muito do local, criando bolsões, os tais campos de refugiados.

Os problemas de adensamento populacional (no Líbano, cuja população é de 4,4 milhões, já há mais de 1 milhão de refugiados sírios, por exemplo) ficam rapidamente evidentes nestas condições. Os primeiros a aparecer são sempre a violência contra as mulheres ou contra os mais fracos.

Manuais e teorias servem como base para a ativação emergencial destes campos, mas não passam disso: bases para ativação. O dia-a-dia e a diminuição do estresse dessa população não constam desses manuais. Isso passa por outro tipo de intervenção que é bem capaz de criar um novo tipo de distúrbio.

Melhorar as condições arquitetônicas desses campos, a médio e longo prazo, não iria melhorar a situação geral. O que era para ser temporário, torna-se fixo. E, era do "fixo" anterior que se fugia. Este novo "fixo" trás consigo seus próprios problemas.

Refugiados belgas na França, 1914-15

Siga meu raciocínio; se as pessoas fogem do "fixo" para o "temporário" que, com o tempo se transforma em novo "fixo". De onde as pessoas hão de fugir, pelas mesmas razões que fugiram do primeiro lugar. E assim por diante. Logo (silogísmo besta, eu sei) o problema não é, de forma alguma, o local... "fixo".
O problema são as pessoas que o habitam.
Somos nós... gente.

Refugiados Palestinos

Os refugiados SÃO uma parte importante do problema. Eles não pedem para estar alí, eu sei.
Não podemos, nem devemos, penalizá-los mais ainda. Todos com certeza quereriam estar em suas casas! É lógico que como em todo ajuntamento humano se aglomeram alí, boas e más, pessoas.
E, para encurtar a história, acabam transferindo o problema para outros locais. Não é culpa deles.
Ninguém chega uma bela manhã, abre as janelas e sorrindo diz: "olha quem veio almoçar conosco! A Guerra, a Fome, a Peste e a Morte! Oy vey! (אױ װײ)"
Inocentes todos...

Veja, há uma dicotomia explícita em todas as áreas de conflito.
Há, de um lado, os beligerantes, armados até os dentes e prontos para matar pelos motivos que forem, nem precisam ser os "motivos certos". E do outro, os refugiados, em desabalada fuga. Nem sempre para o lado certo, mas nessas horas o importante mesmo É correr!

Muitos fogem apenas com uma trouxa de roupas e outros nem isso! Largam tudo o mais e vão arrastando com eles, seus filhos e velhos. Não há código de vestimenta na hora de sair correndo.

Refugiados Coreanos, 1951

Não estão ali para aproveitar de nada. Quando chegam aos campos de refugiados, lhes é oferecida comida quente e uma tenda, se tanto. Não consigo me livrar das imagens da 2ª Guerra e de outras menos populares ou cinematográficas. Filas enormes de gente levando trouxas às costas e um olhar de desespero, esvaziado de humanidade.

Posso parecer insensível, mas longe de mim, sinto o desamparo e me solidarizo com cada um deles. Não deixo, por esse mesmo motivo, de ver o que fazem uns com os outros. "Homem lobo do homem" disse Hesse (o Hermann, não o Rudolf) uma vez, não foi?

Refugiados Vietnamitas

Generalização!
Será que estou a cometer isso? Como vés, sou um porco-espinho.
Lamento é, eu mesmo não ver a solução, por isso parece uma generalização. Mas, é essa mesma generalização que é utilizada por manuais de ajuda e teorias benfeitoras de organizações internacionais, e ninguém reclama disso!

Por isso não coloquei no meu comentário o tão procurado: "Eis a solução" (ir-ia colocar: "Euréka", mas achei pedante sair pelado correndo no meio da rua, fazendo escândalo e alvoroçando os cães). Mas, o quadro que ninguém quer ver passa invariavelmente por ai.
A distância, e a internet, adoçam quase tudo.

Refugiados Vietnamitas

Generalização não resolve.
Ou, resolve tanto quanto campos de refugiados...
Campos de flores (onde para nascer precisam ser enterrados).


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